terça-feira, 5 de agosto de 2014

A Foda FODA


"Tudo no mundo é sobre sexo exceto o sexo. O sexo é sobre poder."
Oscar Wilde

Já usei esta frase antes em um post antigo , mas a citação vale à pena ser lembrada.

Há na relação sexual uma disputa de poder, de controle, de dominação, mesmo na mais tenra e carinhosa reciprocidade alguém está na posição de comando e alguém se submete ao outro. Saber ceder e performar em ambas as posições é uma arte, existe quem se sinta satisfeito ou seguro em uma ou outra posição, de dominador ou de dominante, contudo entender a necessidade do outro e dar espaço para que o seu cúmplice possa atuar sendo ativo ou passivo é uma das maiores formas de cumplicidade que um casal pode atingir. 

O sadismo e o masoquismo levam este conceito a outro nível e não é todo mundo que está pronto para adentrar este mundo de fetiche, couro, chicotes e nós. O bondage é uma arte para poucos, por certo, que vai muito mais longe que cinquenta tons de cinza. A palheta de cores deste universo é incontável e os quadros são a pele de quem ousar se arriscar a provar. Não há regras fora as que as próprias pessoas se impuserem.

Mesmo assim, o conceito vale para todos, o de que a força de quem está no comando provém da submissão do outro, ao compreender isso, que tudo se relaciona ao desejo e confiança de entrega, os limites do prazer são levados até o inimaginável.

Alguém tem que ceder o que não é deixar de ganhar, de se satisfazer, pelo contrário. É entregar as rédeas para aproveitar a paisagem da viagem. As sensações do orgasmo, cada arrepio e reação que para quem não é suficientemente seguro, pode parecer constrangedor, porém para quem se ama e não possui trincheiras entre si, é algo sublime.

Encontrei uma definição desta ideia em um dos filmes mais polêmicos e chocantes já feitos, "A Serbian Film - Terror sem Limites", um filme que eu não recomendo a ninguém a assistir porque é o mais pesado que já assisti e definitivamente pouquíssimas pessoas vão conseguir compreendê-lo. O filme se passa dentro do submundo dos vídeos snuff e envolve estupro e pedofilia, medonho, porém é possível compreender que ele usa da metalinguagem para criticar o próprio gênero que não traz nada de artístico e sim de monstruoso e que simplesmente explora a violência gratuita sem qualquer talento ou outro motivo envolvido se não o lucro da parafilia e do crime.

Entretanto há em uma fala entre os personagens logo no início do filme uma interpretação muito sincera do que estou discorrendo que não está ligada ao enredo principal:

"Seu senso de manipular uma mulher, o seu ritmo para esgotá-la, para humilhá-la, e então quando ela é reduzida a uma cadela, para reconquistá-la. E o seu amor por isso, isso é arte."

Esta é a definição do trabalho de Milos, o personagem principal do longa, considerado o maior ator pornô do mundo no filme e o único capaz de trazer beleza e arte para aquele mundo de entretenimento barato. Uma descrição vulgar de uma fonte de péssimo gosto, para dizer o mínimo, a maioria pode dizer - e não estará errada.

Por que então buscar esse tipo de citação quando a princípio tivemos Oscar Wilde?

Porque o sexo é em essência primitivo, um dos instintos básicos do ser humano, uma ligação direta com o seu lado mais animal, assim como a violência também é um dos nossos instintos mais vitais e é impossível negarmos tal fato. Por isso o sexo é um assunto tão difícil de ser discutido e ao mesmo tempo tão explorado, ele traz à tona um lado bestial  de cada cidadão que não cabe na sociedade a não ser na cama. 

"(...) O Homem, que, nesta terra miserável,
Mora, entre feras, sente inevitável
Necessidade de também ser fera."
Augusto dos Anjos

Este trecho do poema "Versos Íntimos" de Augusto dos Anjos traduz de forma espetacular o que exemplifiquei anteriormente, é inerente ao homem ser fera e se tornar uma entre os outros homens-fera. Isso no contexto sexual é latente e vergonhosamente óbvio. A mulher pode amar e adorar ser bem tratada, idolatrada, contudo no ato sexual ela precisa descer do pedestal e sentir-se fêmea e a verdade de sua natureza surge, contrariando todo o feminismo e luta de igualdade de gêneros. Porque não estamos falando de racionalidade, mas de ferocidade, mesmo que haja uma breve luta por controle, de quem ficará por cima, por exemplo, alguém está sofrendo a violência da penetração e alguém a está praticando. A biologia é simples. Isso não é machismo, a natureza nos fez assim e se dentro da sociedade cada um deve e merece receber tratamento igual, do ponto de vista biológico isso é inconcebível. 

Por isso, por mais que tentemos nos esconder e negar os nossos tabus atrás de romances açucarados e contos infantis com moral, precisamos entender que o sexo não é imoral e sim amoral, não existe como racionalizarmos ele e sim, simplesmente, praticá-lo. E embora esta verdade possa chocar todas as moças inocentes, no fim, todas sonharão e desejarão o Lobo Mau quando estiverem a sós com um homem e desprezarão o Príncipe Encantado e sua etiqueta real.

Uma pena que por recalque da sociedade a maioria não saiba como lidar com o Lobo Mau quando encontre um e sofra por isso. O mundo poderia ser muito mais livre se nos aceitássemos como animais que vivem em um cio eterno em que alguém sempre estará fodendo alguém e que ser fodido não é desvantagem.

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