DEPETRIS
Das Pedras à Pedra que o Rio Cavou
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LEGADO - Capítulo IX
Conviver com os meus avós foi um presente que me marcou profundamente e fez de mim, em partes, quem eu sou. Minha filha Sofia e meu filho Igor puderam ao menos um pouco partilhar desta vivência e agradeço demais por isso pois sei o valor dos avós (ou bisavós) para uma criança.
Minha mãe que conviveu praticamente a vida inteira com eles talvez não tenha podido receber o carinho que eu recebi e mesmo assim endereça a seus netos todo o amor que a ela não lhe foi dado como ela gostaria quanto filha. E por isso a agradeço demais por não repetir o ciclo de frieza e conseguir romper essa barreira e abrir o coração para os netos e filho.
À minha mãe, ao meu avô Sebastião e à minha avó Ilda, aos meus filhos Sofia e Igor e à minha mulher Ellen dedico estas memórias para que se conserve o legado das histórias, os causos, os contos e os absurdos que a gente ria juntos e que agora causam sorrisos de saudade.
Ao resgatar a história da minha família – um exercício de escrita e entrevistas que comecei em 2003 e que agora vinte anos depois após a despedida de meu avô encerro – eu preservo a minha leitura de vida e história para que fique para a posteridade registrado não só os que vieram antes de mim, mas eu mesmo me capturo para os que vieram e vierem depois possam conhecer um pouco do passado e não esqueçam do menino que aprendeu a contar histórias com seu avô e do homem que amava sua família.
Finalizo este trabalho de décadas com um tesouro que descobrimos ao desbravarmos os pertences de meu avô. Além de fotos e outras bugigangas de um acumulador contumaz minha mãe encontrou uma página de caderno com um poema de meu avô datado de 2015.
Ali ele deixou aflorar seus pensamentos sobre a sua vida com uma lucidez surpreende. Esse poema é uma prova de que Sebastião tinha sentimentos como eu devo ter de alguma forma pela convivência me infectado com o germe da poesia que nele se escondia pois desde a adolescência a literatura me rende frutos em prosa e verso e até então eu não sabia de onde vinha esta inspiração.
Em 2008 fiz um pequeno poema citando meu avô e suas histórias revelando a sua influência em meu processo criativo e vida.
Seguem ambos os
poemas.
***
Já
carpi roça na enxada
também
já fui tropeiro
depois
vim pra cidade
virei
caminhoneiro
conheci
mais da metade dos estados brasileiros
Já
bebi água de poça
dormi
em cima de urutu
pesquei
no poço do inferno
já
desci no brucutu
gosto
de pescaria
mas
não como peixe cru
Já
fiz viagem longa
do
Uruguai a Pernambuco
os
limão que me atiraram
espremi,
fiz virar suco
hoje
vou até Santa Cruz
beber
pinga e jogar truco
Nasci
de família pobre
mas
fui muito feliz
não
casei com moça rica,
não
casei porque não quis,
hoje
vivo na sombra
na
sombra que eu mesmo fiz
18/01/2015
Sebastião Depetris
(22/05/1934 - 13/07/2023)
***
O
PÁSSARO
Passarinho
assustado, se aninha no meu peito
Não
é armadilha, não é gaiola, é só o meu jeito
Deixa,
esquece o barulho feio do trovão
Vem,
repousa no refúgio, faz de mim o seu abrigo
Descansa
a cabeça, alivia o peso, confia em seu amigo
E
esquece a tormenta que atormenta o seu coração
Fica
perto, pra eu te contar as histórias do meu avô
Pra
eu te ninar, entre os meus pelos
Para
eu te carregar em minhas mãos
Vem
sonhar sonhos verdes
Quando
tudo é escuridão
02/02/2008
JOSÉ
RODOLFO KLIMEK DEPETRIS MACHADO
(03/10/1986)
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