sábado, 24 de outubro de 2015

Liberdade

Um sorriso atirado em solo fértil, mesmo que por brincadeira inconsequente ainda assim pode germinar. Como na teoria do Caos onde um bater de asas de borboleta em um lado do mundo pode acarretar em um tsunami no outro lado, um sorriso atirado a esmo é tão fatal quanto uma bala perdida.

Por isso decidi fazê-lo, sem medo, sem me preocupar, atirei um ricocheteante sorriso e deixei ela lidar com ele. Na verdade, abusei da sorte e lhe atirei vários, como uma metralhadora automática lhe mostrei os dentes como um animal enraivecido, beijando-lhe em meus sorrisos. Lhe desejando em meus sorrisos. Lhe amando em meus sorrisos.

Ela, acanhada, não sabia o que fazer com eles, com esse ataque, assédio de sorrisos e segundas intenções. Tudo era novo para ela, mas sem querer, ela me sorria de volta. Talvez fosse apenas porque o sorrir é uma das expressões mais humanas e trabalha em um nível subconsciente onde sorrimos para quem quer que seja que sorria para nós. Um condenado no paredão de fuzilamento, até vendado, se sorrir, mesmo sem poder ver saberá que o soldado se pegará sorrindo de volta antes de apertar o gatilho e assim saberá que ele foi perdoado. Talvez fosse só isso, uma ação involuntária como um soluço, como o piscar dos olhos, como o bater do coração. Mas não, pois eu podia perceber quase com certeza absoluta que seu coração acelerava quando eu me aproximava.

Os meus sorrisos chegaram mais longe do que imaginei, nos encantaram, enlaçaram, nos enlouqueceram e nos aproximaram. Eles adentraram sua boca e lhe encheram o corpo de beijos, lhe cobriram de carícias e cafunés. E ela sentiu vontade ao me ver me rabiscar a pele, de fazer o mesmo.

Este ato de rebeldia, esse anseio de liberdade através da tinta foi o que a semente do sorriso germinou, à flor da pele, um desenho para simbolizar o fim das amarras: foi um presente meu a ela. E ela escolheu um dente-de-leão com as sementes voando no vento se transformando em pássaros, um símbolo vivo da natureza e liberdade, a vontade de alçar vôos mais altos e distantes. Uma vez livre ninguém mais consegue voltar para onde antes estava, aprisionado.

Eu lhe dei asas, lhe tirei da gaiola da sua família e lhe aprisionei com uma overdose de liberdade. Ela consertou as minhas asas quebradas de Ícaro que voou perto demais do sol. Assim, vivemos enlaçados e sorridentes, despejando no mundo sorrisos para que haja cada vez mais histórias de amor e menos medo de ser feliz.