sexta-feira, 22 de agosto de 2014

A ERA DAS LOLITAS


  Ela era como a representação de um conto de fada, branca como a neve, linda, aterradora e provocante como uma nevasca e todos os espelhos respondiam que não havia ninguém como ela. Seus olhos amendoados brilhantes e inocentes continham um brilho felino, como um filhote de tigre siberiano que poderia brincar ou retalhar seus dedos. Sua boca, pequena, vermelha e carnuda parecia uma armadilha para engolir a alma humana fraca e seduzível, de milhares de homens sem esboçar pena num sorriso frágil de menina má.

  E sem saber ao certo o que fazer com os seus encantos mágicos, seus dotes, como um capricho da natureza que embelezou uma criatura sem dá-la condição de se conhecer ou de saber de seu real poder ela vivia respirando e anseando por um príncipe que violasse sua torre e a tomasse. Algo mais terrível do que resgatar uma princesa de um dragão é não se deixar cair pelas garras de uma donzela, em seus truques, curvas e promessas vãs de paraíso perdido.

  Por isso ela era como o Narciso, amava-se e ao notar que outros lhe percebiam, amava-se mais ainda. Cobria-se com pinturas como um Dorian Gray megalomaníaco, sonhava com a grandeza de ser desejada na pequenice de seus sonhos febris, místicos e absurdamente tolos. Uma aberração para a sociedade moderna, a ruína dos homens, pois nós por mais racionais que sejamos não deixamos de ser feras e de desejar cobrir as jovens fêmeas.

  Esta é uma era de Lolitas imbecis que não servem para nada porque sonham em servir, por capricho de seduzir e de ultrajar os pais. Mal sabem elas que seus pais sonham com suas amigas e que suas mães as invejam por terem o frescor do leite colhido de manhã enquanto elas ganham nata e se transformam em queijos bolorentos.

  O feminismo esbarra na vaidade, na superficialidade, na quantidade de admiradores e de gracejos, se antes os homens atiravam flores hoje cobrem os perfis de juras de amor e cantadas baratas, apelativas, para enaltecer egos e inflá-los até se tornarem gigantes e mesmo assim, continuarem cada vez mais vazios. Para preencher esse abismo na alma procuramos incessantemente preencher os orifícios do corpo e saciar os prazeres da carne e ao nos servimos sentimos mais fome.

  Porque o mundo está no cardápio para quem quiser e puder agir sem temer as consequências, as sereias ninfetas pulam para dentro do aquário pelo prazer de ver os homens salivando por devorá-las como lagostas em um restaurante de frutos do mar. 

  Na vida os seios e o pênis crescem mais rápidos do que a mente e assim a biologia entrega a crianças quase adultas armas de destruição em massa, capaz de fazê-las se multiplicar e de gerar novas almas. Hormônios e feromônios, cio interminável e jogo de poder, é uma caça, uma corte, uma dança, um sofrimento e um inferno. Porque não devemos tocar o fruto proibido, apenas aqueles incapazes de saboreá-lo devidamente podem fazê-lo e é exatamente por isso que ele nos parece tão doce.

  A maldição dos homens é essa: desejar sem possuir, das mulheres é deixarem de serem possuídas mesmo desejando o serem.

terça-feira, 5 de agosto de 2014

A Foda FODA


"Tudo no mundo é sobre sexo exceto o sexo. O sexo é sobre poder."
Oscar Wilde

Já usei esta frase antes em um post antigo , mas a citação vale à pena ser lembrada.

Há na relação sexual uma disputa de poder, de controle, de dominação, mesmo na mais tenra e carinhosa reciprocidade alguém está na posição de comando e alguém se submete ao outro. Saber ceder e performar em ambas as posições é uma arte, existe quem se sinta satisfeito ou seguro em uma ou outra posição, de dominador ou de dominante, contudo entender a necessidade do outro e dar espaço para que o seu cúmplice possa atuar sendo ativo ou passivo é uma das maiores formas de cumplicidade que um casal pode atingir. 

O sadismo e o masoquismo levam este conceito a outro nível e não é todo mundo que está pronto para adentrar este mundo de fetiche, couro, chicotes e nós. O bondage é uma arte para poucos, por certo, que vai muito mais longe que cinquenta tons de cinza. A palheta de cores deste universo é incontável e os quadros são a pele de quem ousar se arriscar a provar. Não há regras fora as que as próprias pessoas se impuserem.

Mesmo assim, o conceito vale para todos, o de que a força de quem está no comando provém da submissão do outro, ao compreender isso, que tudo se relaciona ao desejo e confiança de entrega, os limites do prazer são levados até o inimaginável.

Alguém tem que ceder o que não é deixar de ganhar, de se satisfazer, pelo contrário. É entregar as rédeas para aproveitar a paisagem da viagem. As sensações do orgasmo, cada arrepio e reação que para quem não é suficientemente seguro, pode parecer constrangedor, porém para quem se ama e não possui trincheiras entre si, é algo sublime.

Encontrei uma definição desta ideia em um dos filmes mais polêmicos e chocantes já feitos, "A Serbian Film - Terror sem Limites", um filme que eu não recomendo a ninguém a assistir porque é o mais pesado que já assisti e definitivamente pouquíssimas pessoas vão conseguir compreendê-lo. O filme se passa dentro do submundo dos vídeos snuff e envolve estupro e pedofilia, medonho, porém é possível compreender que ele usa da metalinguagem para criticar o próprio gênero que não traz nada de artístico e sim de monstruoso e que simplesmente explora a violência gratuita sem qualquer talento ou outro motivo envolvido se não o lucro da parafilia e do crime.

Entretanto há em uma fala entre os personagens logo no início do filme uma interpretação muito sincera do que estou discorrendo que não está ligada ao enredo principal:

"Seu senso de manipular uma mulher, o seu ritmo para esgotá-la, para humilhá-la, e então quando ela é reduzida a uma cadela, para reconquistá-la. E o seu amor por isso, isso é arte."

Esta é a definição do trabalho de Milos, o personagem principal do longa, considerado o maior ator pornô do mundo no filme e o único capaz de trazer beleza e arte para aquele mundo de entretenimento barato. Uma descrição vulgar de uma fonte de péssimo gosto, para dizer o mínimo, a maioria pode dizer - e não estará errada.

Por que então buscar esse tipo de citação quando a princípio tivemos Oscar Wilde?

Porque o sexo é em essência primitivo, um dos instintos básicos do ser humano, uma ligação direta com o seu lado mais animal, assim como a violência também é um dos nossos instintos mais vitais e é impossível negarmos tal fato. Por isso o sexo é um assunto tão difícil de ser discutido e ao mesmo tempo tão explorado, ele traz à tona um lado bestial  de cada cidadão que não cabe na sociedade a não ser na cama. 

"(...) O Homem, que, nesta terra miserável,
Mora, entre feras, sente inevitável
Necessidade de também ser fera."
Augusto dos Anjos

Este trecho do poema "Versos Íntimos" de Augusto dos Anjos traduz de forma espetacular o que exemplifiquei anteriormente, é inerente ao homem ser fera e se tornar uma entre os outros homens-fera. Isso no contexto sexual é latente e vergonhosamente óbvio. A mulher pode amar e adorar ser bem tratada, idolatrada, contudo no ato sexual ela precisa descer do pedestal e sentir-se fêmea e a verdade de sua natureza surge, contrariando todo o feminismo e luta de igualdade de gêneros. Porque não estamos falando de racionalidade, mas de ferocidade, mesmo que haja uma breve luta por controle, de quem ficará por cima, por exemplo, alguém está sofrendo a violência da penetração e alguém a está praticando. A biologia é simples. Isso não é machismo, a natureza nos fez assim e se dentro da sociedade cada um deve e merece receber tratamento igual, do ponto de vista biológico isso é inconcebível. 

Por isso, por mais que tentemos nos esconder e negar os nossos tabus atrás de romances açucarados e contos infantis com moral, precisamos entender que o sexo não é imoral e sim amoral, não existe como racionalizarmos ele e sim, simplesmente, praticá-lo. E embora esta verdade possa chocar todas as moças inocentes, no fim, todas sonharão e desejarão o Lobo Mau quando estiverem a sós com um homem e desprezarão o Príncipe Encantado e sua etiqueta real.

Uma pena que por recalque da sociedade a maioria não saiba como lidar com o Lobo Mau quando encontre um e sofra por isso. O mundo poderia ser muito mais livre se nos aceitássemos como animais que vivem em um cio eterno em que alguém sempre estará fodendo alguém e que ser fodido não é desvantagem.

sexta-feira, 1 de agosto de 2014

Quero que haja sempre uma cerveja em sua mão e que esteja ao seu lado seu grande amor



Às vezes no final da noite sinto muito sua falta. Queria ter você aqui comigo agora. E às vezes no fim da noite sinto uma vontade enorme de tomar um gole de alguma cerveja amarga importada. E ao constatar no fim do meu dia quando deito para descansar que os meus desejos são esses, você e cerveja, não consigo imaginar uma prova de amor maior que essa. Obviamente para quem está de fora pode soar como uma forma estranha de amar, do meu jeito, sempre diferente de fazer as coisas.

Sei que isso não é o que esperam a maioria das mulheres, costumo dizer que para as mulheres serem amadas como sonham, elas devem amar outras mulheres e terem sorte, torcer, para encontrar alguém que possa ser tão carente quanto elas para serem correspondidas da mesma maneira. Os homens são menos glamorosos que as mulheres, amamos sem floreios, somos menos espetáculo. O nosso amor é mais direto, simples, como um leão no circo rugindo contra o chicote do adestrador, não somos o número de mágica, somos feras enjauladas. Mas nem por isso somos menos profundos, amamos menos. Ao menos eu sou assim, já que não posso afirmar sobre todos os homens, falo sobre o homem que sou.

Como uma tempestade de areia que atinge todos os sentidos e arrebata exércitos, não como um jardim secreto escondido onde a Árvore do Segredo da Vida descansa. E ao me deparar que não é apenas por desejo, companhia ou intimidade que sinto sua falta, me surpreendo. Porque sentir isso é irracional. Sinto como se tivesse descoberto uma falha nas leis do Universo, como se tivesse descoberto um segredo da natureza por ninguém ainda revelado. Como se descobrisse que a gravidade não é universal ou uma maneira de enganar a morte. Mas no fundo, para nós humanos, não há nada mais natural do que o amor.

Somos treinados pela biologia para amar. A arma secreta da reprodução - o amor. E treinados para não acharmos que ele é algo natural, mas sim sobrenatural, especial, nos enganamos e nos perdemos. E assim encontramos o paradoxo de loucura do amor, entre o saber e o sentir. A dosagem desequilibrada dessa droga entorpecente engana sentidos e razão. Somos bombardeados pelos nervos super estimulados, glândulas que soltam e produzem substâncias para confundir o nosso cérebro, se espalham e queimam na veia e nos faz ter febre, para interromper as conexões dos nossos neurônios e nos tornar viciados.

A sensação de amar é semelhante a se drogar, produz os mesmos efeitos que saboreamos ao nos embebedarmos. Por isso, quando digo que sinto sua falta de noite, no fim do dia quando a verdade se revela e quando digo que também sinto vontade de tomar um gole gelado de alguma cerveja amarga importada me alegro e ao mesmo tempo me pasmo. Isso, no meu mundo, é realmente amor. Com espuma e malte, ou trigo, em suma: cevada e saudade. E a vontade de brindar a tudo isso é o que me fará acordar de manhã, amanhã e depois.