terça-feira, 29 de janeiro de 2008

Érato


Nas noites de Sonho de Verão, nem todos os sonhos são vãos. O limite, posto que sempre haverá onde o onírico, pois mais lírico que seja, não poderá entrar sem que cause medo e insanidade, é invisível, o véu é leve e fácil de revelar o que não deve. As almas à noite, são frágeis, tolas, inocentemente estúpidas, e não medem as palavras, retirando a poesia que delas estivesse brotando. Nesse vazio, nesse súbito vácuo de dúvida, o nó na garganta, o coração agoniado, sangra borbulhante pela faca de dois gumes que lhe feriu o peito, enganado por seu delírio, que imaginava estar empunhando rosas brancas. Lembre-se dos espinhos, nem todos estão dispostos a se ferir neles, a aceitar a coroa de cravos, no entanto, para quem anseia mastigar a flor, deve passar pelos espinhos. Desculpas são vãs, medem-se por pesos, pelo cansaço, nada será como antes? Não há como saber, sabedoria é o que menos possui uma alma notívaga. Por essa razão, sofre, quando há de sofrer, e goza, quando há de gozar. Não devemos dizer para o ébrio para parar de procurar gênios nas garrafas, ele pode encontrá-lo. E não devemos dizer a musa sobre o que é mortal, os mortais devem se tornar divinos ao lado delas, nunca, jamais, o oposto.
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Na imagem, estão a brincar Eros (deus do amor) e Érato (deusa da poesia, principalmente a erótica).

domingo, 27 de janeiro de 2008

PALAVRAS

PALAVRAS CRUZADAS
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Palavras ao vento, ao acaso, para onde vai tudo isso depois que se esquece? Se há como envenenar alguém com uma língua afiada, víbora, é de se entender que as palavras também possam mais, que vão além. Há a palavra-poesia, retirada bruta, ingênua e inconsciente do desejo, no entanto, a palavra vai além, mais fundo, mais forte. Onde a língua não puder tocar, ela estará lá, talvez causando mais frenesi do que se apenas um corpo tocasse outro. Na palavra, cabem sons, cabem melodias, cabem cheiros, aromas, fragrâncias, os sentidos excitam-se com meras palavras. As palavras não traduzem a volúpia, a incitam para que os olhos que as leiam, sintam o calor da respiração a lhe murmurar no ouvido as mensagens secretas. As palavras são efêmeras, se perdem no vento, precisam do sangue rubro doce, qual chocolate na epiderme, para que permaneçam fiéis entre a lembrança e os olhos. Porém, mais importante do que imprimir, seja onde for, tais palavras, é senti-las, degustá-las. Acordar e perceber que o gosto das palavras proferidas não foram sonhos, restam ainda na boca. O cheiro nos dedos, ilusões etéreas do mistério que é o verbo, no início, era o verbo, e ele era imperativo:
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“_Goza!”

sábado, 26 de janeiro de 2008

Pronomes -ELES


ELES
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Olhe só para eles, estão por toda parte, tomam conta de tudo. Nas ruas, dentro e fora das casas, um interminável enxame. Ao nosso redor, a nossa volta, uma praga divina, piada dos deuses. São tantos, todos absolutamente os mesmos. Apesar de negarem, não aceitarem, brigarem, se assassinarem, mentirem e traírem uns aos outros, se acham melhores, mais elevados. Cada um deles carrega uma pérola de prepotência e uma manada de espíritos de porcos. E sendo iguais em seus defeitos, não reconhecem suas fraquezas estampadas no próximo, são cegos que só enxergam o que os holofotes apontam, a eles mesmos e a mais ninguém. Tristes títeres do teatro infeliz, encenam por toda sua vida a hipocrisia de aceitarem o que sonham que são. Negam a mudança, negam a reflexão, negam a esperança, se esforçam para sorrir ante a janela que dá para o escuro desconhecido, enquanto poderiam simplesmente abrir a porta e se arriscar. Eles são tão imperfeitos, qual a imagem e semelhança do que quer que seja, que poderíamos acreditar que não sabem o que fazem? Só se nós nos tornarmos eles, só se quisermos erguer muros, ao invés de derrubá-los. Afinal de contas, ninguém sabe o que faz, mas é preciso fazer alguma coisa. Eis a nossa diferença.

Estou ajudando a promover a mudança

O poeta, o artista, o filósofo; o trapezista, o escritor e o maluco; o aventureiro, o amante, o palhaço — eu e você — nossa função agora é subir à tona, saltar barreiras, desbravar caminhos, quebrar ícones da moral, defender a liberdade, amar demais, criar conceitos, mudar o mundo, viver a mil. O professor, o artista e o poeta; a bailarina, o cantor e o libertário; o estudante, o anarquista e o profeta: todos os que já deixamos o rebanho e saltamos profundo — nós somos a vanguarda da História. Vivemos arriscando a Vida, só para salvá-la.
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E somos loucos – simplesmente porque não podemos ser outra coisa.
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Edson Marques - MUDE

quarta-feira, 23 de janeiro de 2008

Pintando o Sete

Desenho meu onde retratei a minha filha, Sofia, com dois meses.

sexta-feira, 18 de janeiro de 2008

Pronomes - EU

EU

Desculpe-me, eu realmente não tenho culpa. Eu não sabia. De qualquer forma, você sabe, pessoas como eu, têm imunidade, estamos acima de qualquer desconfiança e suspeita. Em todo caso, eu prometo esquecer de tudo isso. Na verdade, já esqueci, tudo que sei é que eu estava aqui, e o mundo continuava a girar a minha volta. Eu nem te vi, sabe, gosto muito de pensar comigo mesmo, eu sou uma pessoa muito interessante. Nunca fico entediado, acho que mais pessoas deviam dar espaço para ouvir o que eu tenho a dizer. O mundo é injusto... Por que eu? Por que logo eu tenho que consertá-lo? O que seria do mundo sem mim? Eu faço a minha parte, distribuo sorrisos, carinho e sonhos, se com isso as pessoas começam a fantasiar com o impossível, eu já não posso fazer mais nada. Eu não sei por que todos são tão infelizes, eu estou muito bem com o que tenho, muito obrigado por perguntar. A minha vida poderia servir de exemplo, seja feliz com você mesmo, nascemos sozinhos e assim vamos morrer. Não importa quem está ao seu lado, você não deve amar ninguém mais do que a você mesmo. E dessa maneira, naturalmente, mais pessoas o amarão. O que surpreende os outros não é dinheiro ou poder, é o amor-próprio. Que morram todas as baleias, golfinhos, crianças, árvores, antes de tudo isso, existe a minha pessoa. Eu preciso me alimentar, matar a minha sede, sede de prazer, para depois pensar no resto. É a sobrevivência, os cientistas estão do meu lado, os governos estão do meu lado, e eu estou do lado deles. Não se envergonhe de ser quem você é, a única coisa que você possui é a sua identidade. O seu país, a sua família, o seu lar, estão dentro da sua carne. O resto, porque são sobras do que você descarta, são sombras na parede da caverna. O que!? Você quer que eu pague pelo amassado? Quem você pensa que é?! Quem? Vá à merda, e eu com isso?

quinta-feira, 17 de janeiro de 2008

Pronomes - NÓS


NÓS
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Quem somos nós? Ora essa, nós somos nós. Você sabe, pare com isso. Não precisamos de alguém como você, nós sabemos que somos algo que não deveria existir, que somos miseráveis e medíocres. Não temos passado e não temos futuro, somos a decadência que surpreende apenas em se tornar mais decadente com o passar do tempo. Não temos heróis, não temos nada, o nosso entretenimento é a mágoa, a bebida, o cigarro, a violência, a tragédia alheia e a inveja. Não suportamos o sucesso entre nós, é o pior ultraje. Esperança? Agora sim, você está parecendo um de nós, claro que temos esperança, que algum tsunami mate milhares de pessoas em algum lugar para que possamos nos alegrar. Somos rasos, vazios, absurdos. Entre nós, os melhores são menos piores. Os felizardos são os que saem daqui, e conseguem suportar amargando o sofrimento longe somente para não dar o braço a torcer quando voltam para cá, o nosso sonho é nos exilarmos de nós mesmos. Somos fantasmas vivos, já morremos, sabemos disso, só a morte é que precisa ser avisada. Somos mornos, somos cinzas, somos médios, somos tediosos. Uma tarde, interminável, horrorosamente infinita. Nós somos tudo que não são eles. O resto, o todo. Somos a lágrima salgada no oceano de doçura, quando olhamos para a noite, não vemos estrelas, vemos a escuridão entre elas. Somos uma parte que todos possuem, na verdade, nós, só possuímos essa parte. Somos o mistério da matéria escura, não existimos, exceto para nós mesmos. Somos sombras das nossas sombras. E você, é um de nós?

segunda-feira, 14 de janeiro de 2008

A minha cabeça-de-vento...



ONDE O MINUANO MORRE

Nos céus de minha terra
Quando Éolo e seus servos
Austro, Bóreas, Euro e Zéfiro
Promovem guerra

O firmamento sangra
A rosa-dos-ventos despedaçada
Em tempestades profanas
Ecoa das Cumullus Nimbus a batalha

Varrem os sonhos para longe
Enlouquecem as mentes desesperadas
Perdidos estamos sós
Entre a tormenta e o tormento
Andorinhas sem asas

O frio gela, a chuva de lágrimas doces
Servidas em uma taça de prata

Aqui é onde o Minuano morre
Este é o cemitério dos sonhos sem nomes

Aqui é onde o Minuano morre
Esta é a terra onde se enlouquece, agoniza e falece
A esperança dos dias que nunca chegarão

Todos nascem em Itararé, ansiando pelo verão

E as aves de mau-agouro colhem os seus tesouros
Os suicidas que se enforcam com cordas de varais
Tocam a melodia medíocre da nossa farsa

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